O blog é assim, tal como a Internet: não tem seqüências, ''inícios'', meio ou ''fim''. Pode ser lido em qualquer ''ordem''. Do mesmo modo as coisas funcionam na cabeça de seu ''criador''. Posso falar aqui de coisas que aconteceram há 3 meses ou mais, mas que estão sendo ''pensadas'', relembradas neste instante. Uma delas eu considero o melhor filme brasileiro deste ano, que ficou meras DUAS semanas em cartaz aqui em São Paulo. Trata-se da obra ''Otávio e as Letras'', de Marcelo Masagão. Uma película decididamente ''esquisita'' e ''anti-comercial'': mostra uma capital paulista- certamente filmada nos finais de semana e em horários pouco usuais- soturna e VAZIA. E o que faz este ''Otávio'', o personagem principal? ''Otávio'' é visto comprando revistas e livros usados em sebos. Em casa, ele freneticamente recorta palavras e as cola em folhas de papel- que depois são enroladas e deixadas em lugares estratégicos pelas ruas. Estas são as ''armas'' e as ''bombas culturais''( este é o termo utilizado no filme) do nosso personagem ''Otávio''. De que ele vive não se fala. Sabemos que tem poucos recursos, já que ele pede usualmente ''descontos'' para os proprietários dos sebos e mora em um lugar muito simples, recursos estes todos utilizados nesta prosaica ''guerrilha pelo saber''. Outro personagem interessante é um motorista de táxi que dirige um velho fusquinha. No teto do carro foi colocado um mapa da Cidade de São Paulo. Enquanto dirige o seu estranho táxi, ele vai contando a história de cada uma daquelas ruas para os passageiros que, interessados, fazem algum comentário sobre o mapa no teto interior do veículo...''Otávio'' tem uma interessante vizinha que- suspeitamos, pelas viagens noturnas que ela faz de táxi- vive de ''programas''( sexuais, não televisivos...). Ela entrará na vida de ''Otávio'' em determinada hora do filme, e isto é o mais próximo que temos de uma estória ''convencional''...O que nos interessa nesta descrição toda de ''Otávio e as Letras'' é que esta obra é uma narrativa de alguém que faz o mesmo que todos os blogueiros, porém usando métodos tradicionais, ''do passado''( é triste pensar em um mundo onde livros e palavras escritas e publicadas em meios tradicionais como o papel referem-se ao ''passado'', mas esta é uma forte tendência da atualidade...). Lançar aqui e ali inofensivas ''bombas culturais'', com referência a fatos estranhos e alheios à realidade de seus receptores, é o esporte favorito de todos os que escrevem- seja de que forma for. A palavra, tanto no filme mencionado como na realidade crescentemente dominada por meios audiovisuais de grande apelo, como ato de subversão. De resistência. Assumidamente ''demodeé'', ultrapassados, lançamos aqui e ali nossas palavras ao vento, como náufragos que mandam uma mensagem dentro de uma garrafa para fora da ilha deserta onde fomos jogados...As palavras são as nossas pontes, nossas balsas, nossos foguetes e aviões, enviados mundo afora como sinais de vida, de existência. ''Penso, logo existo''. E escrevo, para lembrar-me desta existência cada vez mais fluida e ''virtual'' ,em meio a um mundo de imagens e lembranças. Nossas ''bombas'', felizmente, não tem ''inimigos'', nem ''alvos'' a destruir. Como dizer que a leitura está em ''declínio'' ,em um meio dominado pela palavra, lida e escrita? Enquanto houver alguém querendo escrever- seja de que modo for- e alguém querendo ler algo em forma de palavras, isto é sinal de que nem tudo está perdido. ''Otávio'', este ser estranho e indefinido cuja única atividade na vida é soltar aqui e ali as suas ''bombas culturais'' cuidadosamente confeccionadas durante suas leituras, é um interessante exemplo de mediador: ele envia as palavras escritas e reunidas ao ''acaso'' para seus potenciais leitores, que podem estar em qualquer lugar. Faz a junção entre o que foi escrito e criado e aqueles que possam estar, eventualmente, interessados nestas informações. ''Antiquado'', pelo meio, e ''moderno'', pelo papel que executa, ''Otávio'' é a cara desta nossa pós-modernidade extremamente veloz e ''técnica'', mas ainda indefinida. A vida não tem, para infelicidade de uns e alegria de outros entre os quais me incluo, ''Manuais de Instrução''. Nosso grande ''método'' ainda é este: ''erro'', correção, ''erro'', correção, ''acerto'', novo ''erro''...
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