sábado, 9 de agosto de 2008

Interpretações...

Interpretar é algo que fazemos o tempo inteiro. De tal modo que, por ser uma atividade cotidiana, acaba muitas vezes passando despercebida. De nós mesmos. Choveu forte nos últimos dois dias em São Paulo. Após um mês e pouco da maior seca que esta metrópole já teve nesta época do ano, chove e faz um pouco de frio. Ontem fazia 15 graus no meio da tarde na Avenida Paulista. Marca esta que caiu para 14 no fim de tarde. Contrariadas, as pessoas botam mais uma vez todas as suas roupas de frio guardadas nos armários, sabe-se lá se conservadas com naftalina...E voltam os mesmos velhos comentários de como ''o tempo está feio, ruim''. Para mim, o tempo nunca esteve TÃO BOM! É assim que eu o interpreto. Em um plano maior, não há tempo ''bom'' ou ''ruim''. A alternância entre dias frios e quentes faz parte de qualquer ecossistema equilibrado. O perigo é justamente o fato de estarmos perdendo cada vez mais estas alternâncias...Tudo é interpretável. Mesmo o assassinato, maior dos crimes, pode ser justificável diante das circunstâncias. Assim entende o sistema juridico. Por isto, as decisões dos Tribunais são repletas de termos como este: ''por si só''. O fato y, ''por si só'', não justifica a ação x. Até poderia, dependendo do caso concreto...Voltando ao tema interpretação, um dos campos que mais dá campo a interpretações é o campo da espiritualidade. Por isto, o mundo está cheio das mais distintas e exóticas religiões. Peguemos, para exemplificar o ato de interpretação, uma expressão comum em determinada ordem religiosa familiar a nós todos. Uma frase de uma oração bem popular, o ''Pai Nosso'': ''Seja feita a Vossa Vontade''. Costuma-se proferir tal frase como se estivéssemos indo para a forca. ''Nada deu certo. Rendo-me. Seja feita a Vossa Vontade''...Profere-se estas palavras com tristeza, e um profundo fatalismo...Porém, como tudo na vida, estas simples palavrinhas comportam um mundo de interpretações. Lidamos com um Universo aparentemente misterioso. Como pode um Poder- e entendemos esta palavra em termos humanos- não interferir diante do ''mal'', ''ralhar'', ordenar, comandar, destruir os nossos ''inimigos''? A fé que temos está entrelaçada o tempo inteiro com dúvidas e questionamentos semelhantes. Utilizamos nossos termos- expressões como ''Pai'', ''Poder''- para tentar compreender coisas muito maiores, além da nossa simples compreensão. Pensamos em Deus como ''alguém'' que está em ''algum lugar'', não é? E é para este ''ser'' que dirigimos os nossos mais desesperados apelos e queixas, muitas vezes ''não ouvidos''...Afinal, um Poder comum tem Palácios, certo? Tem uma Capital, o mais das vezes luxuosa. Tem uma ''corte'', onde estão os nobres que assessoram o Rei a governar. Tem Leis que, caso não obedecidas, implicam em severas punições para os seus ''transgressores''...Um Poder, nos nossos termos, tem de mandar. Deve mostrar toda a sua força. Atemorizar seus inimigos. Pensar em um Poder não-local( está em tudo, em todos os lugares, mesmo aqui dentro de nós), que não busca comandar ou explorar, que admite ser negado ou contestado, que parece ''invisível'', que não se mostra para que todos o obedeçam, que aceita a nossa plena liberdade- até mesmo para que cometamos os piores e mais indefensáveis atos- isto tudo dá um ''nó'' em nossas mentes, certo? Aqui entram os'' Quatro Compromissos''. Um deles afirma taxativamente: ''Não acredite em si mesmo''. Louco isto, não? Precisamos calar as nossas ''vozes interiores''- a nossa ''estória pessoal'' de tristezas, insucessos, dor, sofrimento- para alcançar os nossos maiores sonhos. Não é Deus que nos impede de atingir nossas metas: somos nós próprios...Aqui, o ''seja feita a Vossa Vontade'' já começa a ganhar um novo e possível significado: ''sabemos que os Vossos Planos para as nossas vidas são muito MELHORES do que os MAIORES planos que nós possamos ter concebido algum dia. Decidimos suspender as nossas barreiras, os campos de força ( os fãs de Ficção Científica conhecem bem o conceito...)que criamos ao nosso redor, com propósitos defensivos, mas que estão neste exato momento nos impedindo de receber as inúmeras dádivas que o Senhor concebeu para nossas existências''. Aos que crêem, de verdade, como poderia a vontade Dele ser contraposta à nossa? A única ''batalha'' está em nossas mentes...Podemos escolher como nos sentimos. Certos dias, ficamos tão felizes que parece que vamos ''explodir'' de tanta alegria. Não conseguimos sequer colocar isto em palavras que os outros possam compreender. Quem nos ouviria, de fato? Quem estaria disposto a ouvir os nossos uivos de felicidade? Sentimos, nesta hora, que é preciso utilizar uma linguagem comum à de nossos semelhantes. ''Baixamos'' a nossa energia- que estava em um estado semelhante ao de quando éramos CRIANÇAS- para podermos nos comunicar melhor com nossos amigos e conhecidos. Se quisermos ''platéia'', nestas horas, temos de falar de nossa ''dor''. Ouvimos suas lamentações, suas mágoas, para replicar com as nossas. Insano, não? Os praticantes disto dizem que dá um ''alívio''...A grande dificuldade é que tentamos atingir um estado de ''Felicidade'' por meio das nossas dores e sofrimentos...O ''seja feita a Vossa Vontade'' suspende as barreiras, não as elimina( nem à nossa autonomia e liberdade). Devolve-nos ao nosso estado natural, estabelece um ponto inicial de diálogo com um Criador que é pura Alegria. Ao final deste processo, nos tornamos todos crianças novamente- brincando animadamente ao redor de nossas ''bolas'', ''carrinhos'' e ''bonecas'' ( metáforas para exemplificar os nossos desejos) pelos quais pedíamos e suplicávamos com tanta tristeza e rancor...