Ao contrário do romance de José Castello, carioca radicado em Curitiba, já comentado neste blog, o livro que iremos comentar aqui, embora também mencione a bela capital paranaense, parece ter sido escrito por alguém que não a conhece. Sequer parece ter estado lá. Mas isto não prejudica a estória, interessante. Falo do romance de um escritor novato, ''De cabeça baixa'' ( de Flávio Izhaki ). O livro é a estória de um aspirante a escritor, que acaba de lançar um livro chamado ''Desencanto'' ( ô título desanimador...). O lançamento é prestigiado apenas por seus amigos e pela namorada. O livro encalha. O namoro acaba. O escritor, desiludido, decide ''exilar-se'' em Curitiba, onde vai dar aulas de literatura. Um belo dia, passando por um sebo, ele depara-se com o próprio livro ( que cena cruel! ), e repara com uma dedicatória feita a uma mulher. Tudo isto remete ao passado, e ele decide voltar à tórrida cidade de ( São Sebastião) do Rio de Janeiro, para rever a mulher amada...Claro que não é só isto. Este é o esqueleto de uma estória interessante. Mas as cenas em Curitiba não falam das ruas, nem dos lugares típicos e históricos. Superficialmente, o autor apenas faz breves alusões ao frio e á chuva intermitente. Tudo isto pode nos dar a falsa impressão de que o tempo lá ''é isto'' e acabou. Não é. Já estive no verão, e é um calor dos infernos...Ao contrário de São Paulo, lá os prédios são afastados e as avenidas mais largas, o que dificulta minhas tentativas de ocultar-me dos cruéis raios de sol...Loucuras? Veja também o meu texto anterior, sobre o frio, e entenderá tudo...Enfim, a graça do romance reside, em boa parte, no contraste que o autor estabelece entre o frio de Curitiba- local do ''auto-exílio''- e o calor do Rio de Janeiro. Não é um livro excepcional mas, no meu caso, certamente ESTE romance não merece, e não irá, parar em um sebo, ao contrário do livro da estória...
quinta-feira, 17 de abril de 2008
Homenagem aos lugares frios...
Este poderia também ser o texto de número 100 mas, cronologicamente, vem a seguir: Como amar alguma coisa que não conhecemos? Eu ''gosto'' de certas cidades que não conheço, como Paris e Nova Iorque. Não posso dizer que as amo, ainda, por não possuir neste momento elementos suficientes para tal. Por isto, ainda estamos na fase de namoro...Corrijam-me se a expressão francesa estiver escrita de modo errado, mas lugares frios me dão a sensação de ''déjavu''. Eu SINTO que já habitei um lugar destes, tenho ''memórias'' esparsas quanto ao ocorrido. Dirão os materialistas que eu adquiri esta sensação pelas leituras e ao assistir filmes. Os espiritualistas dirão que eu já morei de fato nestes lugares, em outras vidas, e trago a memória destas experiências. Só assim, mesmo, para explicar como alguém- nascido na quente capital do país, no Planalto Central- se tomou de amores por cidades do Sul do Brasil. Vejam bem: minha simpatia por lugares frios pode ter me induzido a gostar de Curitiba, que conheci há apenas 4 anos. Mas gostar de fato, isto requer o pacote completo. Eu sabia que iria gostar( no futuro, quando conhecesse). Ao conhecer, tive o pacote completo: frio, mais os inúmeros parques e bosques, mais a mistura de vilarejo com capital, mais um excelente e modelar sistema de transporte, uma cidade que, como Brasília, parece ter sido planejada, transparece organização. Mas, ao contrário da capital federal, ainda mantém resquícios deste planejamento, da fase áurea. Enfim, é um excelente lugar para morar. Sinto inveja de seus habitantes. Mas quero ir além: em muitos filmes gaúchos, uruguaios e argentinos há um elemento em comum, que me desperta profunda simpatia. A fuga da cidade, rumo a lugares praianos ermos e frios...Sem contar o fato de que as praias gaúchas e uruguaias são muito parecidas: quilômetros e mais quilômetros de dunas, numa procissão sem fim. Ao ver isto, em filmes, a vontade que dá é de pegar o ônibus mais próximo e embarcar. Ir até o extremo sul, a Patagônia ( seu céu, visto em um filme também, é uma das coisas mais belas deste mundo...). Ir à praia de casaco de frio, gente! Eu fico admirado com isto, um gosto que só posso ter adquirido em outra vida mesmo...Você, a praia deserta, um frio de congelar os ossos, um sobretudo, boina de lâ, uma rede, e um livro no colo...Isto me cheira ao nada, ao ponto básico da existência, o congelar como uma metáfora do tempo congelado. Aqui no Brasil, um lugar onde acho que encontraria isto em determinada época do ano- e por isto sonho em conhecer este lugar onde nunca fui- é Rio Grande, no Rio Grande do Sul. As estradas gaúchas, as ''freeways'', nos convidam a viajar. Lembro-me de placas em espanhol, quando fui a Gramado, ao cruzar a ''freeway''. Sonho: cruzar a fronteira, percorrer o Uruguai passando pela sua bela capital ( que não conheço, mas de que já gosto antecipadamente...)Montevidéu, e cruzar o Rio da Prata em uma barca, rumo a Buenos Aires( este é outro sonho, diverso do da praia gelada...). Eu fico admirado, nos filmes, com a Escócia e seus altos penhascos litorâneos. Aquilo cheira a literatura, a ''Morro dos Ventos Uivantes''...Minha mais distante lembrança de frio remete a uma viagem a São Paulo, no início dos anos 90. Me empolguei com o frio que estava fazendo, e comprei um sobretudo em uma loja próxima à Avenida Paulista. Levei-o para Brasília, onde foi devidamente encostado- por falta de uso- e posteriormente doado...O Rio de Janeiro tinha uma loja especializada em artigos para viajantes que vão para lugares frios. Luvas, cachecóis, casacos. A loja, segundo o jornal ''O Globo'', fechou...São Paulo tem franquias de uma loja curitibana, a Otello. Entre os artigos, cachecóis, camisas de flanela, sobretudos, calças de veludo. Aqui em Sampa ainda é possível usar coisas do gênero, embora cada vez menos provável. O frio anda encurtando. O LUGAR CERTO para estas coisas é Curitiba, no inverno. Temperatura perto de zero, tomando um chope bem gelado- engraçado é que eu, sonhando com isto, não gosto de beber, não gosto de cerveja, não gosto de chope!!!?- gorro de lã na cabeça, como o jogador argentino Tévez e os torcedores dos times paranaenses nos jogos em noites frias, cachecol no pescoço...Todos estes sonhos FRIOS foram inspirados por uma semana em que a temperatura oscilou entre 16 e 30 graus. Ou seja, começou com um domingo de sol a 30 graus, mudando no dia seguinte para 25 e despencando na terça para 17/18. O tempo, ele mesmo, me fez querer mudar de Brasília, e o tempo, mais uma vez, me impulsiona, mesmo que de passagem, mesmo que nos sonhos, aos lugares frios e gélidos de uma existência perdida...Memórias antigas de um ex-''homem das cavernas''???
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