No início do século XX o Brasil, claramente, queria copiar os europeus em tudo. O centro da cidade era ''chique'', pois as pessoas se esmeravam para andar o mais bem vestidas possível. Tínhamos bondes, cinemas grandiosos com balcões e música ao vivo. As metrópoles, inclusive a nossa Avenida Paulista, eram mais arborizadas e tranqüilas, um convite para longos passeios a pé. O Brasil que sonhava em ser ''europeu'' mandava seus filhos para estudar no Velho Continente, e o francês era a linguagem dominante...Após a Primeira Guerra Mundial este quadro começou a mudar. A participação norte-americana foi decisiva para resolver o conflito em favor do eixo formado por Grã- Bretanha e França. A invenção do automóvel tornou nossos grandes centros um pouco mais agitados. A divisão de poder, no nosso imaginário, entre europeus e norte-americanos durou até bem depois da Segunda Guerra. Até lá, poucas modificações se deram neste idílico quadro descrito no início deste post. Foi então que o Presidente JK teve a ''brilhante'' idéia de incentivar as montadoras de automóvel a se instalar no país. Ganhamos um dos maiores parques industriais de nossa história, com o surgimento desta região que hoje conhecemos como o ABC( Santo André, São Bernardo e São Caetano)Paulista. Ganhamos rodovias, viadutos, e uma série de ítens construídos para viabilizar a ''modernidade''. Mas, em contrapartida, perdemos muito mais: perdemos praticamente toda a vibrante malha ferroviária, então em franca ascensão, assim como os bondes que percorriam todos aqueles grandes centros. Perdemos ao não investir no sistema público de transporte, sobretudo nos metrôs...Ao melhor modelo norte-americano( nada contra este importante país, e sim contra um tipo específico de padrão de vida criado ali e exportado para o mundo inteiro- amparado nos automóveis...), os carros permitiam agora que as pessoas se instalassem longe dos centros das cidades. Surgiu o grande processo de separação dos indivíduos, com os mais abastados indo morar em condomínios privados na periferia das grandes metrópoles. Os centros, próximos de tudo e inclusive dos locais de trabalho dos que foram morar nos arredores das cidades, entraram em decadência. Hoje o modelo de civilização amparado nos automóveis- assim como, diga-se de passagem, o modelo de capitalismo baseado na ''não intervenção do Estado na economia''...- está a mostrar a sua falência. São Paulo é um exemplo disto, que materializa um de seus piores defeitos: leva-se horas para ir de um lado para outro da cidade, muito mais do que levamos nas estradas ou nos aviões, indo para outros lugares...Mas o Brasil ''modernizado'', com sua violência, seus condomínios de luxo e seus engarrafamentos, tem como contraponto ''ilhas de civilização'' que ainda mantém o ''velho'' estilo europeu. São exemplos disto locais como a região de Ipanema/Leblon( no Rio de Janeiro), dos Jardins( em São Paulo), do Batel( em Curitiba), da Savassi( em Belo Horizonte), para citar apenas alguns exemplos que conheço bem e aprecio...E qual é o ''segredo'' destes lugares ''boêmios''? O segredo é que eles não se renderam á verticalização, restringindo a construção de prédios mais altos. Nestes lugares é possível fazer tudo, ou quase tudo, á pé. Nos vários caminhos que percorremos nestas regiões, é possível tomar um ótimo suco em uma casa especializada( tal como em Ipanema), descobrir um novo café interessante recém-inaugurado ou mesmo ''tomar o café da manhã de sábado ou domingo fora de casa'' em uma padaria ou cafeteria, em confortáveis mesinhas instaladas nas calçadas( como no Leblon), assistir um filme em um de seus diversos cinemas de rua de alta qualidade( como em São Paulo, na região da Avenida Paulista) e, sobretudo, desfrutar alguma de suas inúmeras livrarias( como em São Paulo e no Rio de Janeiro), instaladas tanto nas ruas como nos shoppings dos arredores. Sexta passada, voltando do shopping Iguatemi onde estava sendo realizada a Mostra de Cinema Italiano, quando nos aproximávamos da esquina da Alameda Santos com a rua Haddock Lobo foi possível ver um grupo animado de pessoas bem arrumadas andando pela calçada em animada conversação. Detalhe da hora: era quase meia-noite...Pessoas circulando pelas ruas altas horas da noite, com transporte público de qualidade, este é o maior antídoto contra a violência. Bandidos, como se sabe, preferem lugares e ruas vazias para atacar...Meu Brasil preferido( nada contra os Estados Unidos, ressalte-se, que espero conhecer um dia...)é simbolizado por todos estes ''cantinhos europeus'' preservados em meio à crescente polarização de favelas X mansões. No mundinho ''europeizado'' podemos exercitar a nossa liberdade de ir e vir, longe dos muros( fictícios ou reais)que dividem as cidades cada vez mais. Viva o ''Brasil Europeu''! PS: Este modo de vida não é exclusivo da Europa, claro. Li na ''Revista da Folha'' que uma mulher decidiu vender seu carro e passar a andar de ônibus após viver por cerca de 3 anos em...Nova Iorque...
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