Cresci durante o final do Regime Militar, no Brasil. Por isto, a idéia de apoiar Golpes de Estado protagonizados por integrantes das Forças Armadas me é, à primeira vista, desconfortável- para dizer o mínimo...No entanto, no que se refere ao chamado ''Golpe'' ocorrido em Honduras recentemente, as informações são desencontradas. Do lado do Presidente deposto estão controversas figuras que estão longe de se posicionar no ''campo democrático'': Fidel, Hugo Chávez, Rafael Correa, Evo Morales e até o Presidente Lula( que, há poucos dias, encontrou-se com Kadhafi e o ditador do Sudão...). Junto destes ''democratas'' posicionou-se também, para nossa surpresa, o Presidente Obama( que, segundo artigo publicado recentemente na imprensa paulistana, busca diferenciar-se da imagem tradicional dos Estados Unidos como fomentadores de golpes na América Latina...). Até a Organização dos Estados Americanos( OEA)entrou nesta briga, e fala-se até mesmo em um virtual ''boicote'' a Honduras. Por outro lado, os argumentos em favor da deposição do Presidente Zelaya são bem interessantes. Um artigo publicado na edição de ontem( sábado, 4 de julho)no jornal ''O Estado de São Paulo'' sob o título ''Golpe em Honduras? Que golpe''( assinado por Octavio Sánchez, advogado e ex-assessor do governo hondurenho)trouxe à tona alguns argumentos bastante razoáveis. Ei-los: Segundo o advogado, a atual Constituição de Honduras, promulgada em 1982 após o fim de mais uma ditadura militar, com seus 27 anos de vigência é a mais duradoura da história de seu país. Assim como a nossa, que em seu artigo 60, parágrafo 4, estabelece que ''Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I- a forma federativa de Estado; II- o voto direto, secreto, universal e periódico; III- a separação dos poderes e IV- os direitos e garantias individuais''( este conjunto forma as chamadas ''cláusulas pétreas''), também a Constituição hondurenha possui as suas matérias que não são passíveis de discussão( sob pena de ferir de morte o próprio sistema constitucional). Nas palavras do articulista: ''Ela inclui também sete artigos que não podem ser revogados ou emendados, pois tratam de questões cruciais para nós. Os artigos que não podem ser aterados incluem a forma de governo, a extensão de nossas fronteiras, a duração do mandato presidencial( nosso grifo), duas proibições- uma com relação á reeleição dos presidentes, a outra referente á elegibilidade para a função presidencial- e um artigo que pune a tentativa de alterar a Constituição''. Octavio Sanchez prossegue descrevendo a deposição do ex-Presidente Zelaya: ''no dia 26, o presidente Zelaya emitiu um decreto ordenando que todos os funcionários públicos participassem da ''pesquisa de opinião sobre a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. Ao fazer isto, Zelaya desencadeou um dispositivo constitucional que automaticamente o tirou do cargo''. O termo ''automaticamente'' causa um pouco de estranheza, pois, no Brasil, há que se passar por um longo processo de ''impeachment'' iniciado na Càmara dos Deputados pelo voto de 2/3 de seus integrantes e culminado no julgamento público realizado pelo Senado Federal, presidido por um Ministro do STF. Assim foi a deposição do ex-Presidente Fernando Collor...Mas vejamos o que diz a Constituição Hondurenha, citada pelo advogado/articulista: ''Segundo o artigo 239: ''Nenhum cidadão que já tenha ocupado o cargo de chefe do Executivo poderá ser presidente ou vice-presidente. Quem violar esta lei ou propuser sua reforma, bem como quem apoiar direta ou indiretamente tal violação, cessará imediatamente de desempenhar suas funções e estará impossibilitado de ocupar qualquer cargo público por um período de dez anos''.( nosso grifo). ''Observe-se'', ele acrescenta, ''que o artigo fala em intento e também diz ''imediatamente''- ou ''no mesmo instante'', ou ''sem necessidade de abertura de processo'', ou de ''impeachment''. Por mais drástico que tal dispositivo possa parecer, é avançadíssimo em comparação com a proposta de Hugo Chávez de alterar a Constituição Venezuelana para permitir ''reeleições ilimitadas''. Nosso país, até bem pouco tempo, também agasalhava a tradição da não-reeleição. Tradição que vinha desde a Primeira Constituição da República...Dispositivo infelizmente alterado pelo Ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, com as consequências conhecidas por todos...Prefeitos, Governadores, Presidentes da República sequer precisam licenciar-se para disputar a reeleição, concorrendo em condições desproporcionais com candidatos de oposição...O Governo Lula não assume a autoria, mas também nada faz para impedir o debate entre seus apoiadores de um virtual ''terceiro mandato'' para o Presidente...Vejamos, para concluir, mais um trecho do interessante artigo do causídico hondurenho: ''A Suprema Corte e o ministro da Justiça ordenaram a prisão de Zelaya, pois ele desobedeceu a várias ordens do Tribunal, obrigando-o a obedecer à Constituição. Foi preso e levado para a Costa Rica. Por que? O Congresso precisava de tempo para reunir-se e tirá-lo da Presidência. Com ele no país, isto teria sido impossível. A decisão foi tomada por 123( dos 128)membros do Congresso presentes naquele dia''. Conforme esta precisa descrição, nada mais distante do ''clássico'' modelo de ''Golpe'' liderado por militares, que acabam prometendo eleições para datas futuras e incertas...Creio que, tanto aqui quanto em Honduras quanto em qualquer outro lugar do Planeta, ''golpe'' é um termo que não se enquadra bem quando estamos nos referindo ao cumprimento da Lei e da Constituição do nosso pais, não é mesmo? Alcnol. PS: Desejoso de ficar ao lado de seus pares latino-americanos, o Presidente Obama parece ter cometido o primeiro grande erro de seu governo neste assunto de Política Externa. PS2: Brevemente escreverei outro artigo sobre este polêmico caso de Honduras. PS3: Tanto parece não ter havido ''golpe'' nenhum que já foi deflagrada uma Campanha Eleitoral para a Presidência daquele país, e nenhum dos candidatos- obviamente- fala em devolver o mandato ao Presidente que traiu a Constituição hondurenha...
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