Não costumo tratar de temas políticos neste blog. Nos últimos tempos, estes assuntos tem me provocado um profundo tédio. Pulo as páginas políticas nos jornais. Quando ouço a chamada ''direto de Brasília'', mudo o canal de TV. Isto não quer dizer que não tenha as minhas opiniões políticas, ou que não vá votar este ano. Isto não quer dizer que jamais me pronunciarei sobre o tema, em quaisquer circunstâncias. Muito embora seja muito mais animador ''escolher'' um candidato a Presidente dos Estados Unidos, este ano, do que qualquer candidato a Prefeito ou Vereador- com as devidas exceções- no Brasil...Mas este não é um ''post'' sobre política( com p minúsculo mesmo). É sobre um tema público. Sobre um tema que todos acabamos discutindo. A chamada ''Lei Seca'', as novas punições aos motoristas que dirigirem alcoolizados. Lembremos, em primeiro lugar, que nos últimos tempos multiplicaram-se os casos de acidentes de trânsito envolvendo motoristas bêbados. Em função disto, houve um verdadeiro ''clamor popular'' por leis mais severas. Agora, que temos a lei, e as punições mais severas, embora não suficientemente severas, estamos nos deparando com um ''clamor'' no sentido inverso. Fala-se em ''inconstitucionalidade'' da lei. A imprensa mostra uma grande quantidade de motoristas punidos. Note-se que o comportamento hesitante e ''ciclotímico'' é algo típico do brasileiro. E que, deste ponto em diante, propositadamente abandonaremos as observações típicas referentes aos ''brasileiros''- ''eles'', ''os outros''- e adotaremos o NÓS. Isto é forte. Outro dia estava falando nos paulistanos, e escolhi falar em ''nós ,paulistanos''. Estava falando das escolhas políticas dos munícipes. ''Nós, paulistanos'', votamos nos políticos que gastaram bilhões em obras viárias que levaram a este trãnsito infernal de hoje...Que não investiram no transporte público...Eu não morava aqui quando tais políticos foram eleitos. Se morasse, não votaria neles. Porém, como cidadão desta cidade, as escolhas políticas erradas me afetam. Eu não estou livre delas. Sou também responsável, indireto, por elas. Assim, ''nós, paulistanos''...Brasileiros, argentinos, italianos, todos tem(os) um ponto em comum. Todos tem(os) opinião sobre tudo. E estas opiniões giram quase sempre sobre o que ''deveria'' ser feito para melhorar algo. Falamos sobre a ''sujeira dos políticos'' como se fosse algo que nos afetasse apenas indiretamente. E como se estes políticos surgissem do nada. ''Ninguém'' os escolheu. ''Ninguém'' votou neles. Como que por ''milagre'', eles se apossaram dos cargos de vereador, prefeito, governador, presidente da república... Do mesmo modo, em tese, apoiamos a tal ''Lei Seca''. ''Apoiamos'', no que não nos atinja. ''É preciso parar a carnificina nas estradas brasileiras'', clamamos. O complemento não dito mas subentendido é ''desde que não dependa de mim''. Desde que ''eu'' não tenha de pagar uma multa de mil reais além de ter a carteira suspensa por um ano ''só'' por ter tomado uma ''pequena dose'' da minha cerveja predileta. A ''Lei Seca'' aqui, como quase todas as leis, é aplicável aos ''outros''. Os ''outros'' não sabem dirigir. Os ''outros'' estão bebendo demais. ''É correto aplicar multas aos que falam no celular enquanto estão dirigindo, mas eu estava 'apenas' falando um pouquinho''...E dá-lhe ''chiadeira'', dá-lhe ''choradinha'', dá-lhe tentativa de subornar os guardas, dá-lhe reclamação contra um ''sistema tão injusto''. E também uma tremenda inveja daquelas nações ''civilizadas de Primeiro Mundo'', onde as pessoas não atiram lixo nas ruas, param os carros para os pedestres atravessarem nas faixas, respeitam as leis de trânsito. O brasileiro- ou melhor, NÓS, brasileiros- é (somos)digno(s) de inspirar um livro como ''O Médico e o Monstro''. Porém, nas nossas cabeças, somos todos ''médicos''. ''Monstros são os outros''...''Alguém precisa fazer alguma coisa'', bradamos em coro, ''desde que não sejamos nós''( pensamos em nosso íntimo). Como pode uma ''Lei Seca'' dar certo em um país em que ninguém pretende parar de beber? O resultado só poderia ser este, o coro crescente contra o ''rigor'' da Lei que outrora defendíamos...''É complicado'', diremos nós, os paulistanos...Aqui, bradamos contra o trânsito infernal, que nos sufoca. ''Alguém tem de fazer alguma coisa''. Que coisa? Aumentar o rodízio, que desrespeitamos usando o carro ''extra'' da família? Cobrar um pedágio urbano, que ''driblaremos'' pegando uma rota alternativa? Ter automóvel, aqui, é mais do que uma necessidade. É símbolo de ''status'', nos define como pessoa. ''Como seria bom, pensamos, se todos os demais motoristas deixassem seus carros em casa e usassem mais o transporte público...''. ''Por que ninguém faz nada a nosso favor?''
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