domingo, 24 de fevereiro de 2008

Pequeno GRANDE livro- II

Como vocês puderam ver, chegou um momento em que eu cansei de digitar TUDO o que havia de importante no livro ''Conversas com Kafka'', atividade que me custou umas DUAS horas pela manhã de sábado. Tomei fôlego, e aqui estou novamente com mais alguns trechos interessantes. ESPERO concluir esta atividade hoje. Ela é muito mais penosa do que a simples leitura do livro, que reputo como o MELHOR já lido neste ano de 2008...IRONIA: (...)É possível que eu dê assim às coisas uma certa claridade, como fazem os iluminadores sobre um palco mergulhado na penumbra. Mas não é nada disso: na realidade na realidade o palco não está mergulhado na penumbra, está inundado pela claridade do dia. É o que faz com que os homens fechem os olhos e vejam tão pouco. -Entre a realidade e a visão que temos dela existe freqüentemente uma distância dolorosa- observei. Kafka aprovou com um sinal e disse: - Tudo é combate, luta. Só merece o amor e a vida aquele que deve conquistá-los todos os dias. Fez uma curta pausa, depois acrescentou a meia voz, com um sorriso irônico: - Dizia Goethe." SOBRE A ÍNDIA: ''- Os textos sagrados da Índia me atraem e repugnam ao mesmo tempo. Como um veneno, têm algo de sedutor e assustador. Todos esses iogues e mágicos se tornam senhores da vida, em sua contingência natural, não por um ardente amor à liberdade, mas por ódio, não expresso mas glacial, da vida. A fonte dos exercícios religiosos da Índia é um pessimismo infinito'' (p.98). SOBRE OS ANARQUISTAS: '' - Não leva a sério os anarquistas tchecos? Kafka sorriu embaraçado. - É complicado. Esses indivíduos que se intitulam anarquistas são tão gentis e tão amáveis que não se pode acreditar em tudo o que dizem. Mas, ao mesmo tempo e justamente por causa dessas mesmas qualidades, não se pode acreditar que possam ser realmente esses destruidores que pretendem ser. - Conhece-os, então, pessoalmente? - Um pouco. São pessoas muito gentis e divertidas''. ( p.99) SOBRE LEITURAS, no caso a do livro "A Cortina Negra, romance das palavras e dos acasos", de Döblin: - Os acasos só existem em nossa cabeça, em nossas percepções limitadas. Eles são os reflexos dos limites de nosso conhecimento. A luta contra o acaso é sempre uma luta contra nós mesmos, e nunca podemos ganhá-la inteiramente. Ora, esse livro não diz nada disso. - Está então decepcionado com Döblin? - Na realidade, só estou decepcionado comigo mesmo. Esperava algo de diferente do que, talvez, ele queria dar. Mas a obstinação dessa espera me cegou de tal maneira que pulei as linhas, as páginas e finalmente o livro inteiro. Não posso então dizer nada desse livro. Sou um péssimo leitor" ( p.106/107). SOBRE A POESIA: ''Falávamos de Baudelaire. - A poesia é doença-disse Kafka. - Mas fazer baixar a febre não basta para recuperar a saúde. Ao contrário! O fogo purifica e ilumina'' ( p.109). SOBRE A HUMANIDADE: ''- A maioria dos homens não é ruim, disse Franz Kafka enquanto falávamos do livro de Leonhard Frank, O homem é bom. - Os homens tornam-se maus e culpados porque falam e agem sem imaginar o efeito que terão suas palavras e seus atos. São sonâmbulos, não patifes." ( p.112/113). SOBRE A DESORDEM: ''- Se me queixo da desordem do escritório e, de maneira geral, da desordem que me cerca , é um truque para tentar dissimular a inconsistência de minha vida aos olhares inquisidores do mundo que me cerca. Na realidade, só vivo graças a essa desordem: ela me permite extrair o pouco de liberdade pessoal que me resta." ( p.117) DESTINO X ESCOLHA: ''(...)Mas a raiz de todo erro humano é assim, escolher, em detrimento do valor moral que parece difícil de atingir, o não-valor cuja proximidade é sedutora. - Talvez o homem não possa agir de outra maneira, observei. Kafka sacudiu vigorosamente a cabeça. - Não. O homem pode agir de outra maneira. A queda é a prova de sua liberdade." (p.125/126) O DEUS DOS ALEMÃES: (...)''- Como?- Eu estava perplexo. - Os alemães não são um povo teocrático. Não têm nem Deus nacional nem templo especial. - É o que geralmente se admite, mas a realidade é bem outra- disse Kafka. - Os alemães têm o Deus que faz crescer o ferro. Seu templo é o estado-maior prussiano. Começamos a rir, mas Kafka afirmou que falava seriamente e só ria porque eu mesmo ria. Era um riso contagioso." (p.129) SOBRE SEU TRABALHO NO ESCRITÓRIO: (...)"O que me falta é um trabalho digno desse nome. - Como?- repliquei, um pouco desnorteado. - O senhor tem seu cargo no Instituto de Seguros, onde é muito estimado...Mas o Doutor Kafka interrompeu-me: - Não chamo isso de trabalhar, mas de apodrecer. Toda vida verdadeiramente ativa, direcionada para um objetivo, preenchendo verdadeiramente um ser, tem o ímpeto e o brilho de uma chama. Mas eu, o que faço? Fico lá, naquele escritório. Ele não passa de uma fábrica de fumaça fedorenta, sem nenhum sentimento de felicidade. Por isso minto tranqüilamente às pessoas que me perguntam como vou, em vez de simplesmente dar as costas em silêncio como o condenado que sou de fato." (p.145/146) SOBRE A IMPRENSA: ''- A verdade faz parte do pequeno grupo de coisas realmente grandes e preciosas na vida: não podemos comprá-las. O homem a recebe como um presente, como recebe o amor ou a beleza. Ora, os jornais são uma mercadoria, então se faz comércio. - A imprensa serve então para atoleimar a humanidade, observei timidamente. Franz Kafka começou a rir, projetando o queixo com um ar triunfante. - Nao, não! Tudo serve á verdade, mesmo a mentira. As sombras não eclipsam o sol"(...)Disse-me um dia: - Quando se diz em alemão que alguém está enfiado em seu jornal, esta expressão explica perfeitamente a realidade. O jornal apresenta os acontecimentos do mundo justapondo-os como um amontoado de pedras e um amontoado de sujeira. É uma mistura de terra e de areia. Onde está o seu significado? Ver a história como um amontoado de acontecimentos não quer dizer nada. Tudo depende do significado dos acontecimentos, e não o encontramos no jornal, encontramo-lo unicamente na fé, na objetivação do que parece fortuito(...)O Dr. Kafka disse-me um dia- não sei mais em que ocasião- que a leitura dos jornais era um vício ligado à civilização. - É como acontece com o fumo: somos obrigados a pagar aos nossos opressores para termos o direito de nos intoxicar." (p.149/150). ESTADO X POESIA: ''Falamos das 'Leis' ideais de Platão, que eu lia na edição Eugen Diedericks. Eu achava grave que Platão excluísse os poetas da cidade. Kafka me disse: - É muito compreensível. Os poetas tentam dar ao homem outros olhos, a fim de mudar a realidade. Por isso são elementos realmente subversivos, porque querem a mudança. O Estado e, com ele, todos os seus devotados servidores só querem uma coisa: durar" (p.164). Àquele(s) que porventura possa(m) ter aguentado chegar até aqui, um abraço.

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