domingo, 7 de dezembro de 2008

A obra de arte na Era da Descartabilidade Imediata...

Os situacionistas, comandados por Guy Debord, já proclamavam em meados dos anos 60 do século passado o ''fim da Arte''. O perigo de se argüir o ''fim'' de alguma coisa é que isto exige ou a morte prévia disto de que estamos falando ou a sua morte iminente. E, no caso, muito foi feito sob o rótulo de ''Arte'' de lá para cá, o que pode ter contribuído para desmoralizar um pouco o argumento dos defensores da ''Morte da Arte''. Melhor seria pensarmos em um processo. Diante de ''filmes-pipoca'' como este recente ''Rede de Mentiras'', com Leonardo Di Caprio e Russell Crowe, pouco mais de duas horas e meia de torturas, tiroteios, atentados sangrentos como tradicional nesta espécie de ''blockbusters''- geralmente acompanhados por seus espectadores com baldes gigantescos de refrigerantes e ...pipocas- saímos dali nos perguntando se queremos lembrar de alguma coisa. Ou melhor, se podemos lembrar algo...Esta espécie de filme cumpre uma exclusiva função: preencher um buraco de duas horas e meia entre uma atividade e outra. Não saímos dali mais inspirados, mais felizes, ou necessariamente entretidos com algo minimamente útil. Este também é o papel exercido pelas redes de ''fast food''. Elas não podem- nem desejam, na verdade- satisfazer plenamente as necessidades de seus clientes( falo do ponto de vista da nutrição, claro...). Por que são extremamente lucrativas? Porque atendem a demanda do mundo moderno por velocidade. Elas são rápidas, muito rápidas. Nos 15 minutos que muitas pessoas dispõem para almoçar, nada melhor do que uma ''comida'' que é preparada em um minuto e meio ou, no máximo, em dois minutos. O feliz consumidor procura uma mesa mais próxima, e faz a sua refeição ''tranqüilamente'' pelos restantes dez minutos, doze minutos...Claro que isto não satisfaz. Daqui a uma hora ele estará faminto novamente. Se dispuser de um tempo extra, precisará colocar outra coisa descartável na boca. Talvez um doce trazido de casa...Por não satisfazerem nossas necessidades nutritivas, deparamos com um fenômeno tipicamente moderno: multidões de gordos subnutridos...Bem diferentes dos esqueléticos africanos que não tem comida para degustar, os nossos gordinhos comem mais do que nunca na estória da humanidade. Em todos os lugares, todos os instantes do dia. E jamais estão satisfeitos, para a alegria das redes que continuam a fornecer-lhes os alimentos ''saborosos'' nos quais eles estão viciados desde a tenra infância...Beba um destes refrigerantes utilizados para acompanhar as refeições. Dez ou quinze minutos após, estaremos definitivamente sedentos de novo. Isto é uma máquina de fazer dinheiro...Mas não é este o tema deste post. Falávamos no ''Fim da Arte'' não como um acontecimento repentino, já produzido ou na iminência de sê-lo, e sim como um processo. Algo que vai se dando de modo acumulativo, gradual, assim como os quilos na balança dos consumidores de ''fast food''...Ainda há arte. Ainda podemos listar aqui e ali, em qualquer categoria artística, algumas obras-primas. ''Medos Privados em Lugares Públicos'', do cineasta francês Alain Resnais, está sendo exibido há mais de um ano no mesmo cinema( Belas Artes)aqui em São Paulo( já o vi duas vezes, por sinal, e diante da ''seca'' de boas atrações cinematográficas neste final de ano talvez até mesmo o assista pela terceira vez...). Bom, mas a esta altura deste post o que se pode esperar é, minimamente à guisa de conclusão, estabelecer qual é o critério para afirmarmos que a Arte não está ''morta'' ou ''quase extinta'', mas em um longo processo de declínio desde meados do século passado( o que daria um pouco de razão ao genial autor de ''Sociedade do Espetáculo'', Guy Debord...). Um critério interessante poderia ser o da memória: o que é produzido hoje que poderá vencer a barreira de, digamos, vinte anos. Do que é que lembraremos, de tudo o que leva o nome de ''arte'' hoje em dia, daqui a vinte ou trinta anos? Certamente não deste ''filme'' com Leonardo Di Caprio( reconheça-se que não é a atuação dele que compromete a obra...), assim como não dos baldes de refrigerante e de pipoca degustados durante a matinê...